INQUÉRITO
(Vida, a respeito de)
De
que se compõe ou recompõe o homem?
Das
coisas que somem? Dos textos interrompidos?
Das
pontes queimadas?
Que
elementos bastam para identificar o homem?
A
impressão digital? A série de números?
O
movimento dos membros? Seu inútil apelo?
No
desenho de um papel vegetal? Na botânica
da
vida? Na ficha da polícia?
Em
que partes a vida se divide? Em tempos
distintos?
O agora versus o extinto? Mas quem ousa
dizer
que todas as coisas não se fundem
num
mesmo instante longo e obeso?
Mais
do que de água, o homem é feito de tempo,
da
poeira do tempo que se acumula
por
baixo da porta. A história do homem
não
se lava com água. Ela entranha nas unhas,
nos
poros, nos olhos. O mundo que ele enxerga
tem
a cinza deste pó.
O
que difere um homem? Seu propósito? Sua semeadura?
Ou
os atos já feitos, lavrados em cartório?
Estaria
então sempre ele no meio de um gesto? E ser
pertence
à categoria do incompleto?
Por
que olhar o homem sempre com espanto?
Este
rosto estranho que se forma no espelho,
ou
que surge imprevisto na esquina.
E
que depois desaparece sem deixar pista.
Que
cicatriz tão feia ele tem escondido?
Que
codinome usa em suas fugas?
Mas
onde a saída das próprias paredes?
Onde
a resposta sem meias palavras? O exato termo?
Quando
ontem ele parou de coincidir consigo mesmo?
E
agora como recolher o homem do ventre do homem,
entre
tantas sombras, entre tantos medos?
Como
reconhecê-lo e como acalantá-lo, se lá fora
é
dia claro e não há nenhum sinal de aurora?
Marcus Vinicius Quiroga
Nenhum comentário:
Postar um comentário