quinta-feira, 30 de abril de 2015

ENGAGÉE
























ENGAGÉE
(Gullar Gullar)


O poeta toma partido:
- Como ser neutro? Como ser outro?

O país precisa de quem procure
                                 a aurora

Não se sabe de seu paradeiro
Foi vista pela última vez
             nas mãos de um operário,
no coração dos mais vários cidadãos,
                 porque a aurora
não tem dono,

como os latifúndios vazios

Desapareceu numa rádio-patrulha
sem pista,
sem testemunha

O poeta entra no partido.
No momento em que muitos se escondem
ele assina a filiação

O corpo franzino não tem medo
de telefone,
de pau de arara,
de cadeira de dragão

Ele agora usa a estrela-estigma
              no peito
como um judeu,
um homossexual

Sua estrela é o peito aberto,
onde mal cabe
o coração desnecessário

Mas seu coração cresce
como no poema de Drummond
e forma uma corrente:
            o texto passa de mão em mão
como se um alimento            



Mas muitas bocas sem dente
       estão fechadas para palavras

O poeta é partido.
Uma parte é presa
       presta depoimento
escuta ameaças
           depois é solto

e repartido
como hóstia
entre os leitores, que dobram a cada discurso

Outra parte
permanece com a família
      e leva o menor ao circo,
ao algodão doce, ao palhaço


o outro vai às acrobacias,
ao globo da morte,
              ao equilíbrio no arame

Acredita no trapézio no ar
             e nas mãos dos homens
                 

Utopia é seu codinome














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