Marcus Vinicius Quiroga
ESTUDO PARA ALEIJADINHO
(O xadrez e as palavras)
a lepra de Aleijadinho
esculpe na pedra
como se outra pele
o drama imóvel
com cinzéis tortos
dá forma a profetas
com discursos outros
e uma outra lepra
se as mãos se crispam
fechando o mundo,
resgatam feições de cristos
com rugas de perguntas
dentro de um século
lento, elabora não-horas
na pedra de supostas
permanências
se a arte também aleija
e se afasta de medidas
faz-se ladeira, rua estreita,
faz-se beco sem saída
irregular se ergue,
como quem se movimenta
em calçamento de pedra
pelo país, em noite deserta
arte de dedos disformes,
por onde escorrem certezas,
contraria regras e normas
se quer grotesca, feia
com sua baixa estatura
e corpo mal conformado
propunha-se na arte da fuga
a fazer de pedra voo alto
enquanto lá fora a peste
apodrece corpos e a morte
se espalha pela arte
em movimento inerte
aqui a lepra por ironia
iria se fazer estética
e se marcaria como letra
ou melhor, cicatriz, sequela
na via-crúcis, os passos
tornam-se tontos, tortos
como se fôssemos todos aleijados
num mundo em desordem
e o mestre e artesão,
ofertou seu corpo em partes
e foi se retorcendo para ser
ele a própria arte
Nenhum comentário:
Postar um comentário